Em 16/01/2023 às 05:18 por admin. Publicado em REGIÃO

A comunidade quilombola da Extrema, localizada no município de Iaciara, região nordeste do Estado de Goiás, criaram um ateliê para produção de bonecas de pano que rementem a história e faz o resgate cultural dos povos quilombolas.

Ateliê Terezinha Rocha- Boneca Catarina

Catarina Maria da Conceição (1935-2020) foi benzedeira, parteira, cozinheira, merendeira e professora no decorrer das décadas, Dona Catarina foi protagonista de diversas ações na comunidade, dentre elas, com a amiga Chica incluíram a sussa no Mastro, nas festividades religiosas. Ela faleceu aos 85 anos, mas seu legado permanece na comunidade, sendo considerada a eterna matriarca, o nome da Boneca é uma homenagem à ela.
Terezinha Rocha, a qual o ateliê recebe o nome, era filha de Dona Catarina, foi uma pedagoga liderança com diversos trabalhos prestados à comunidade, ela faleceu em 2017. Embora tenha obtido o título de pedagoga e tivesse o sonho de auxiliar ainda mais o seu povo com a educação e alfabetização das crianças, faleceu sem ver seu sonho realizado.

Terezinha Rocha e Catarina Maria da Conceição (mãe e filha) (2015)
Fotografia: Escola João Damaceno

Produção de bonecas de pano

No ano de 2015, Terezinha criou o primeiro exemplar da boneca, ainda sem o nome de Catarina, e a levou para a escola da comunidade, onde foi servidora(merendeira) por muitos anos, para apresentar às crianças, Projeto Quilombola. Além disso, fez uma boneca para sua netinha que frequentava a escola. Para sua surpresa não houve boa recepção por parte da neta (cinco anos), o que a deixou reflexiva. Após o acontecido, Terezinha conversou com Madalena, presidente da Associação Quilombola Extrema – AQUE, também sua madrinha, e começaram a pensar na identidade da criança quilombola. Levaram a proposta para o grupo da associação, ali, nasceu o desejo de fazer algo para mudar essa realidade, afirma Madalena.

Primeiro exemplar da boneca Catarina (2015)

A produção de boneca de pano, com tecido colorido, foi esquecida há mais de três décadas. Na década de 2010 nasce o projeto de produção de boneca negra. Mas apenas no ano de 2021 foi possível viabilizar o projeto identitário Boneca Catarina por meio de um edital de fomento à cultura, realizado por meio da Lei nº 14.017 de 29 de junho de 2020, Edital CONCURSO N.º 02/2021 SECULT GO - PONTOS DE CULTURA - LEI ALDIR BLANC 2021 - Ponto de Cultura-Aldir Blanc. Foi então criado o ateliê para organização e profissionalização da confecção das bonecas.

Para além da geração de renda

A boneca Catarina, conforme afirma Madalena, vai muito além da geração de renda para um grupo composto por 98% de mulheres negras, ela é carregada de significados e cada detalhe remete a história do seu povo. Ela afirma ainda que após a hegemonização de bonecas com um único padrão, pele clara, cabelos louros e olhos azuis, as crianças negras não tiveram um autorreferencial para construção da identidade.

A roupa da boneca Catarina representa a sussa, dança de roda tradicional das comunidades quilombolas. Existe ainda a versão “bebê” que representa o parto, antigamente todos feitos por parteiras, atividade que Dona Catarina executou inúmeras vezes. Além disso, a boneca tem o propósito de reiniciar um processo histórico de construção de identidade, remetendo a ancestralidade de forma que possa empoderar a comunidade para enfrentamento do racismo estrutural e a inclusão igualitária das mulheres negras na sociedade.

Madalena ressalta o quão é importante a descentralização dos recursos na área da cultura, “não tínhamos alcance”. Porém, diz que ao ler alguns editais elaborados pelo estado, exemplo Aldir Blanc, um ponto ficou evidente: “é necessária uma reflexão sobre as políticas públicas do Estado”, ela ressalta a necessidade de participação de lideranças na construção dos editais, já que o acesso ao recurso por meio do edital de fomento à cultura apresenta o impedimento para servidor/a quilombola, isto é, os escolhidos/as pela comunidade quilombola.

Próximos passos

Os próximos passos do ateliê Terezinha Rocha é fazer com que as bonecas cheguem à todas as escolas da região, já que o produto é uma representação cultural afro-brasileira, o que vai de encontro com Lei 10.639/03, que obriga a inclusão no currículo oficial da Rede de Ensino da temática "História e Cultura Afro-Brasileira". Madalena afirma que já ocorreu a primeira venda para a secretaria de educação do município de Iaciara e que fará contato com todas as demais nos próximos meses.

Onde obter

- As vendas do produto são feitas pelo próprio ateliê por meio do aplicativo de mensagens WhatsApp disponível neste link https://msha.ke/bonecascatarina/.
- Mais informações podem ser obtidas no Instagram do projeto https://www.instagram.com/bonecas_catarina/
- Veja o catálogo de produtos aqui